Notas Expressas

Tivemos um enxugamento do nosso corpo de repórteres, mas estamos, aos poucos, retomando o ritmo de publicação de matérias.
(atualizado em 20 de outubro de 2007)


quarta-feira, 9 de maio de 2007

Futebol!

O que acontece quando os santos confabulam
por Vítor Matos

Reflexões duma semana em que o Brasil respira religião

Quase todos os esportes são regidos pelas leis da matemática e da lógica. Vence a prova o nadador mais bem preparado, sagra-se campeão o melhor time de vôlei, ganha a corrida o motor mais avançado tecnologicamente. Pouquíssimo espaço para imponderabilidades. É só no futebol que o sobrenatural, o fantástico e o místico encontrarão terreno fértil. Aquele drible que contraria a física, o gol no último minuto da prorrogação, a convulsão em dia de final, a cabeçada no peito do adversário, uma derrota quando a vitória parecia certa, o time da várzea bater uma seleção. Por essa fresta, misto de magia com providência divina, é que a religião penetra o futebol, formando uma união eterna e indissociável de duas paixões.

Quando da primeira visita do papa João Paulo II ao Brasil, uma música ― quase um jingle, na verdade ― foi criada para dar as boas-vindas ao pontíficie. “A bênção, João de Deus, o nosso povo te abraça”, era um ― talvez o único ― dos seus versos. Pois bem, a torcida do Fluminense adotou o tal refrão. Até hoje, e mesmo depois da morte daquele papa, quando a situação aperta pro lado do tricolor, lá do fundo do Maracanã alguém puxa um coro: “A bênção...”. Os palmeirenses levavam uma bandeira com a imagem de Nossa Senhora Aparecida nos jogos do time na segunda divisão em 2003. O segundo uniforme da Seleção brasileira (o azul) era tido como agourento pelo elenco da copa de 62, até que um dia circulou na concentração que aquela era a mesma cor do manto da padroeira do Brasil. Isso sem falar nos torcedores que assumem mil promessas para ver seu time campeão e os jogadores que fazem o sinal da cruz constantemente ao longo de uma partida.

No futebol, na maior parte das vezes, fica irresistível apegar-se à fé. É o que farão milhões de torcedores brasileiros na noite de hoje. Jogos decisivos serão disputados, sonhos se despedaçarão ou continuarão vivos. O Brasiliense, por exemplo, se quiser seguir às semifinais da Copa do Brasil, vai ter que vencer o Ipatinga na casa do adversário. O mesmo acontece com o Atlético de Minas, que pega o Botafogo no Maracanã. Já pela Libertadores, São Paulo e Grêmio duelam em Porto Alegre por uma vaga nas quartas-de-final. É bom lembrar que também hoje Bento XVI chega ao Brasil. Ele não tem uma musiquinha, mas não custa nada aproveitar a presença do papa para tentar lançar boas energias sobre o time do coração.

Mas nenhuma equipe que entra em campo hoje à noite vai precisar de um milagre tão grande quanto o do Flamengo. O Rubro-Negro precisa vencer o Defensor do Uruguai por no mínimo quatro gols de diferença para manter aceso o sonho da Libertadores. A torcida, imbuída dessa fé que só no futebol a gente encontra, promete lotar as arquibancadas do Maracanã. Os flamenguistas ficariam ainda mais confiantes na façanha se soubessem do que se passa no plano superior, nas nuvens inalcançáveis do firmamento. São Judas Tadeu, padroeiro do Flamengo e santo das causas impossíveis, e Frei Galvão, o santo dos feriados improváveis, já iniciaram as negociações para atuar em causa do Urubu. Também no futebol a fé move montanhas.

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