Notas Expressas

Tivemos um enxugamento do nosso corpo de repórteres, mas estamos, aos poucos, retomando o ritmo de publicação de matérias.
(atualizado em 20 de outubro de 2007)


quarta-feira, 26 de julho de 2006

Coluna - Futebol

Noite Feliz
por Vitor Matos

Hoje o Flamengo sagra-se campeão da Copa do Brasil. Mas isso pouco importa. Afinal, para os grandes esclarecidos da nação ― aqueles que enxergam além ― , futebol não passa de alienação. Puro pão e circo. Como debater o esporte enquanto a guerra pipoca no Líbano, o terrorismo organizado executa um atentado atrás do outro e a matança de baleias come solta pelos sete mares afora? Pior: como é possível alguém ainda ter o disparate de discutir futebol no Brasil? Um país assolado pela miséria e ignorância, afundado em lama e caos, caminhando, cada dia mais convicto, para a beira do abismo. Futebol, nessa condições, não seria mais que uma frivolidade.

Mas esquecem os grandes esclarecidos da nação ― aqueles que enxergam além ― que, para muitos dos milhões de famintos e perdidos do Brasil, pouca diferença faz a Guerra no Líbano. Pouca diferença faz se ganha o Lula ou o Alckmin. Para as elites, é fácil discutir o que é bom ou ruim para o povo, o que é alienador ou libertador. Terminada a palestra, catedráticos e intelectuais voltam para o conforto de seus escritórios. Enquanto isso, na favela, nas filas de hospitais, nas escolas aos pedaços, a realidade continua melancolicamente incólume. Esta noite, o Flamengo vai dar um motivo para sorrir a milhões de brasileiros sofridos.

Todavia, segundo os grandes esclarecidos da nação ― aqueles que enxergam além ― , uma mente crítica e aberta não assiste a espetáculos deploráveis com um jogo de bola, ela prefere filmes e músicas socialmente engajadas. Essa é a verdadeira cultura dos que lutam por um Brasil melhor. Produções que denunciam, alardeiam, cantam aos quatro ventos as mazelas de nosso povo. Recordes de bilheterias, aplausos, Oscar. A pobreza e as condições sub-humanas continuam, mas não tem problema: é bom que teremos matéria-prima para muitos filmes nos próximos anos.

Não estou dizendo que está certo o futebol ser uma tábua de salvação para as pessoas. O ideal seria que todos tivessem muitos motivos para se alegrar na vida, sendo o esporte bretão apenas mais um deles. Torço por um Brasil em que ninguém precise de uma vitória do seu time para sentir um assomo de dignidade e de orgulho; em que o futebol seja encarado tal como ele é: um jogo. Enquanto não chega esse dia, acho sórdido e arrogante alguns postulantes a intelectuais atacarem uma das poucas fontes de alegria que restaram ao brasileiro.


P.S.: Na falta do Mestre, chamaram o Dunga.

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