Notas Expressas

Tivemos um enxugamento do nosso corpo de repórteres, mas estamos, aos poucos, retomando o ritmo de publicação de matérias.
(atualizado em 20 de outubro de 2007)


quarta-feira, 12 de julho de 2006

Coluna - Futebol

Heróis sob encomenda
por Vitor Matos

O brasileiro sofre de um mal que eu mesmo cataloguei como a “Síndrome da Telenovela”. Em outras palavras, nós (me incluo só por educação) tendemos a agir como se a vida fosse um grande folhetim das oito. Pior, forçamos situações para que nosso cotidiano, sem graça, fique cada vez mais parecido com o dia-a-dia dos protagonistas. Disseminassem as novelas brasileiras bons ideais, eu não veria mal algum em querer reproduzi-las na vida real. Mas sabemos o quão duvidosa é a qualidade dessas produções.

Decorre daí que, em cada esquina, tem alguém achando que está imerso numa trama de Manoel Carlos. Por isso, no Brasil, criam-se tantos rótulos simplistas para identificar as pessoas. Atribuímos aos outros as mesmas características lineares e pobres com as quais os personagens são constituídos nas novelas. Fulano é o vilão, cicrano é o mocinho. Minha sogra é a megera, a cunhada de beltrano é a loira burra. Wilsinho é um nerd enquanto seu irmão, Félix, é um esportista... Convenhamos, as personalidades das pessoas são bem mais complexas que isso.

No futebol (nem ele escapa!) a Síndrome da Telenovela também interfere. Veja o caso do Zidane. Por que ele é tão exaltado? E o Roberto Carlos? Por que está sendo tão execrado, a ponto de uma entrevista sua ganhar ares de inquérito policial? Só consigo enxergar uma explicação para sustentar o culto ao francês e o repúdio ao brasileiro: a necessidade que se tem, no nosso país, de atribuir, a qualquer custo, os títulos de herói e de vilão. Só pode ser isso, porque nem Zidane fez uma excelente Copa (longe disso), nem Roberto foi catastrófico (perto disso, é verdade). Eis o que se faz em terras tupiniquins: idolatra-se os grandes feitos, exagera-se os erros; atribui-se certa dramaticidade às biografias dos envolvidos e, por fim, fecha-se os olhos para os fatos tais como transcorreram. Pronto! Temos uma novela na vida real!

A Copa não teve brilho, não teve super-homens, nem Lex Luthors. Mas uma cena em especial ( ah, que momento!), compensou todo o marasmo do torneio: a carecada de Zizou no tórax do Materazzi. Fiquei feliz. Por causa desse acontecido, valeu a pena esperar quatro anos pela Copa. O zagueirão italiano mostrou que, acima de tudo, um jogador precisa de picardia. Não faço idéia do que ele disse na hora, pro Zidane. O importante é que conseguiu parar, com as palavras, o jogador que muitos acharam difícil parar na força. Futebol também é cultura.

De todo modo, hoje volta o Campeonato Brasileiro. Sinal de que a vida continua. Para quem se acostumou com os estádios de Berlin, Nuremberg, Munique & cia., sempre lotados e impecáveis, será um choque rever o Alfredo Jaconi, o Parque Antártica, o Arrudão e todos os demais. Todavia, para quem já estava entediado com os jogos insossos da Copa, é momento de celebrar. A bola volta a rolar no país do futebol.

P.S.: Sorte da loja, que não vai precisar ceder um novo televisor para os clientes que embarcaram na promo

Nenhum comentário: