Artigo
O Brasileiro e a Política
por Marco Prates
Ok, nosso povo tem fama de esperto e malandro. Ok, nossos jovens não venderiam o voto por R$ 10, mas pensariam duas vezes se o valor fosse cem vezes maior (“O jovem e a política”, 18/03/2006). Sim, nós não podemos nos orgulhar de ter um país com baixos níveis de corrupção e sim, virou moda falar das incongruências financeiras - novo eufemismo para os recursos não-contabilizados de Delúbio – que os próprios cidadãos brasileiros exercem no seu dia-a-dia. Mas, para o bem ou para o mal, podemos nos orgulhar da sinceridade da nossa nação. Pelo menos é o que se constata na pesquisa do Ibope, apresentada na última quinta-feira sob o título “Corrupção na Política: Eleitor Vítima ou Cúmplice?”.
Como advertiu o repórter do Correio Braziliense, Rudolfo Lago, cuja matéria serviu de base para esse artigo, é muito fácil julgar a senhorinha Ângela Guadagnin (PT-SP) e sua dancinha pra lá de formosa. Mas parece que somos, antes de tudo, seres emocionais. E esses seres fazem qualquer coisa para livrar a si próprio ou um amigo de problemas. Não cabe julgar aqui o mérito da questão, apenas tê-lo como um fato, salvo raras exceções. Não é surpresa então que, dos 2.002 entrevistados na pesquisa, 69% já transgrediram alguma lei ou contrato para benefícios pessoais, de forma consciente e racional.
Atitudes como ganhar descontos em consultas sem recibo, propinas para policiais, compra de produtos piratas, ligação clandestina de TVs a cabo estão entre as transgressões éticas avaliadas. Aí entra o louvado mérito de nossa população com sua honestidade exacerbada: 75% acreditam que cometeriam pelo menos uma das 13 transgressões propostas na pesquisa, e 60% cometeriam nepotismo se ocupassem um cargo de liderança pública. Não obstante, conseguirem prever o futuro (cometeriam), ainda são capazes de se imaginar em cargos públicos e, nestes, cometendo irregularidades. Ponto para a falta de ética na fantasia.
Uma coisa é certa: para admitir todos esses dados, o brasileiro não deve gostar nem de seu próprio caráter. Um homem de angústias, que quer ser bom, mas é atormentado pela própria canastrice. Aplausos para nossa complexidade dostoievskiana: não somos honestos – nem nos espelhamos como tal - mas seguimos vivendo.
A corrupção é de fato irrestrita, mesmo nas universidades, recantos sagrados do conhecimento e da contestação. E não cito o reitor e sua administração (que devem ter sua parcela também), mas os próprios estudantes. Em uma de suas edições do semestre passado, o Campus (Jornal Laboratório da UnB) publicou uma matéria sobre várias “corrupções” (Introdução à Corrupção, era o nome da matéria) que se passam neste local de estudo e pesquisa. As mais impressionantes referiam-se a representantes que usurparam dinheiro de seus Centros Acadêmicos para proveito próprio e outros que deixaram dívidas pessoais para futuros colegas.
Seguem-se discussões se o problema ético, pra lá de sua face pública, está também encarnado em todos os grupos e camadas da sociedade, ou seja, a raiz do problema está mais embaixo. Mas aí já é um estudo a parte. Vale apenas citar que um honroso recorde foi obtido em 2005: a carga tributária brasileira chegou a 37,82% do PIB, um ponto percentual acima do ano anterior. Isso deve ao menos fornecer uma mínima fatia para explicar a razão da corrupção do povo - aquela que vem de baixo – e daquela que vem de cima. Essa última, a que torna nossos jornais mais emocionantes todos os dias.
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