Futebol!

Uma crônica de duas cidades

Por Vítor Matos

Todo pensamento precisa de uma bela paisagem que lhe sirva de catalisador. As profundas atividades da mente, as criativas, aquelas que, enfim, resultam em frutos vistosos vieram ao mundo senão porque seus donos tinham ao seu redor um ambiente agradável e idílico. Poesias dificilmente nascem nas carvoarias. Demandam árvores, flores, morros, oceanos, praias, gaivotas, sol...

Nesse ponto - como podemos observar graças à martelação eterna do Pan - o Rio de Janeiro é um dos lugares do país mais propícios para o desenvolvimento do ser artístico. Não é à toa que ali é o berço da bossa nova, do biquíni fio dental, da torcida do Flamengo e de outras maravilhas. A cabeça humana, quando salvaguardada dos tiros, funciona bem em terras fluminenses.

Mas ainda assim, o Rio não é a cidade brasileira mais indicada para receber os Jogos Olímpicos. Antes, Brasília - acredite - seria a mais apta para o papel. Vejamos por quê:

a) Clima: Olimpíadas sempre ocorrem no meio do ano, geralmente julho ou agosto. Pois bem, a situação climática no Rio é instável nesse período. Chove muito - chega ao ponto de prejudicar algumas modalidades, basta ver que o softball no Pan ainda nem começou por causa do aguaceiro - e quando abre o sol é aquele calor de fritar havaianas no asfalto. Em Brasília, apesar da baixa humidade do ar, o inverno é bem confortável, temperatura amena, céu azul, nenhuma chuva.

b) Transporte: Escusado de falar sobre o trânsito no Rio. Por mais que se façam as arenas dos jogos perto da Vila Olímpica, em algum momento uma delegação, uma equipe de jornalismo ou uma horda de turistas precisará encarar a rua aberta , inevitável. Acredite, mesmo sendo as Olimpíadas um momento para vivenciar novas culturas, atletas ainda preferem chegar a tempo numa competição a angariar experiências antropológicas no túnel engarrafado. Em Brasília, ocorre o contrário. Aqui, exceção feita a um ou dois casos, o problema é a falta de tráfego. Um pouco a mais de carros animariam nossas avenidas.

c) César Maia: Em entrevista ao Correio Braziliense, no domingo anterior ao Pan, o prefeito do Rio expôs suas razões para justificar a Barra da Tijuca como o lugar perfeito para competições de grande porte. Um dos motivos seria o fato de, naquele bairro, as favelas não terem traficantes (é ou não é o máximo?). Em Brasília, por seu turno, não há favelas.

O Rio de Janeiro precisava entender que sua contribuição como celeiro imaginativo do Brasil já é um serviço e tanto prestado à nação. Porque não é fácil fazer, ao mesmo tempo, as vezes de cenário de novela, palco de westem urbano e berço de poetas. Devia ter a humildade de delegar as tarefas burocráticas para as cidades chatas, pragmáticas e funcionais (modernas). Afinal, uns nascem pra Rio, outros pra carvoaria