Notas Expressas

Tivemos um enxugamento do nosso corpo de repórteres, mas estamos, aos poucos, retomando o ritmo de publicação de matérias.
(atualizado em 20 de outubro de 2007)


quinta-feira, 3 de agosto de 2006

Passados que não se apagam

Personagens antigos revelam um passado valioso da UnB
por Cristiano Zaia

“Era um dia normal em que eu cortava cabelo, quando o assessor do então ministro Aureliano Chaves reclamou sobre o regime militar. Por um instante, outro rapaz abaixou o jornal desconfiado. Num ato suspeito de investigação, identificou-se e pediu para que ele prestasse depoimento no órgão adequado. Era informante do Exército e estava disfarçado de civil”. História intrigante e reveladora de uma triste realidade de repressão, que vem à tona pela experiência de Francisco de Amorim, “Seu Chico Barbeiro”.

Esse interessante episódio, de datas sombrias do período militar no Brasil, representa apenas um fragmento que também ilustra e abre as portas para o cenário de um instigante palco de personagens únicos: a UnB. Abrir algumas páginas dessas histórias é parte da memória viva de muitos candangos que, sem querer, doaram um pouco de suas vidas à Universidade.

Ao longo de 46 anos, muitas foram as pessoas que por lá passaram, seja prestando serviços como professores e funcionários, seja como alunos que bastante contribuíram para a sua trajetória. Um personagem muito lembrado, até pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE), que leva seu nome, é Honestino Guimarães, aluno atuante e de esquerda, que desde cedo representava os interesses estudantis e, por isso, pagou caro no regime. Luiz “Leite”, proprietário da Papelaria Oriental, desde 1978 na UnB e um dos criadores da ASFUB, também ressalta a forte postura do então Reitor naquele período, Comandante Azevedo, bastante coercitivo e criticado pela comunidade acadêmica.

Realmente, a ditadura parece ter deixado marcas até hoje no imaginário das pessoas. “A UnB era conhecida como antro de comunistas”, revela Paulo Roberto, dono da Stok Lanches, um dos primeiros estabelecimentos comerciais da Universidade. “Deixei Ritinha várias vezes trancada nesse laboratório”, afirma Jeová Batista, responsável pelo Laboratório de Fotografia da Faculdade de Comunicação, há 31 anos lá. Ele se refere à ajuda que deu a uma aluna muito procurada na época, cuja única saída era se esconder à noite para não ser presa. Atos como esses demonstram o grande vínculo dos funcionários com a UnB, mesmo em tempos difíceis.

Apesar de muitos relatos sobre a presença da ditadura na UnB, existem pessoas que nada têm a contestar. No caso dos funcionários, havia uma ordem para se retirarem antes da entrada dos milicos no campus. Argemiro Gomes, o “Andrade” do Cine Foto, nunca presenciou violência ou repressão. Ele que até já foi presidente de Grêmio Estudantil.

A verdade é que se torna quase impossível achar algum funcionário antigo na UnB que não reconheça a importância dela em suas vidas. Mesmo que se sucedam reitores ou críticas a ela. "Só aqui pude conhecer Nelson Mandela, Edgard Morin, Milton Santos, Darcy Ribeiro”, diz Francisco de Carvalho, que comenta a respeito dessa oportunidade que até hoje tem de vender livros em palestras de grandes pensadores.

Certamente, a história da UnB é muito rica e, conseqüentemente, muitos personagens ficam de fora dos relatos. A título de conhecimento, pode-se encontrar o livro “Passados que não se apagam” de Sebastião Varela, defensor contumaz da Universidade e o filme “Barra 68”, de Vladimir Carvalho. No mais, é importante que sempre se valorizem essas pessoas, que até hoje vivem pela e para a UnB. Não deixemos que as páginas dessa obra sejam rasgadas ou esquecidas.

3 comentários:

Anônimo disse...

Então, apenas pra acrescentar.
Outro livo existente que fala um pouco sobre a história da UnB e de Brasília no período da ditadura é A Rebelião dos Estudantes, de Antonio de Padua Gurgel.
Bacana o texto.

Anônimo disse...

muito bacana
gosto dos textos do Zaia

Anônimo disse...

Cristiano Zaia,
Gostei do texto,
muito bom!