Coluna - Futebol
Planeta Bola
por Vítor Matos
Um russo, um americano e um brasileiro embarcaram rumo ao espaço. Não, não é piada ― se assim o fosse teríamos também um português na turma. Trata-se da mais límpida realidade: Pavel Vinogradov, Jeffrey Williams e Marcos Pontes compõem a tripulação da Soyuz TMA-8, nave russa com destino à Estação Espacial Internacional (ISS), numa viagem que os levará há mais de 300 km da atmosfera terrestre. É a primeira vez que um nativo da terra brasilis vai ao espaço, cem anos após Dumont cruzar os ares a bordo do seu 14-bis, setenta e dois depois de Leônidas da Silva ter inventado o gol de bicicleta. Já era tempo. Agora nossas crianças, além de paquita e corredor de Fórmula 1, vão sonhar também em ser astronautas. Um pequeno passo para Pontes, um pulo para a nação.
Contudo, a despeito de todo pioneirismo, é impossível deixar de notar um fato muito curioso nessa história toda. Um dia antes de sua partida, Pontes deu entrevistas e foi bastante assediado pela imprensa. A grandeza do seu feito suscitava várias perguntas, gerava assuntos em profusão. Mesmo com tanto a ser dito, pessoas a ser lembradas, dúvidas a ser sanadas, o astronauta brasileiro encontrou tempo para metralhar as seguintes palavras: “Para comemorar os seis campeonatos do mundo que a equipe brasileira conquistará, vou levar uma camisa da Seleção” ( Correio Braziliense, 30/03/2006). Pronto! De repente, quando menos se espera, alguém fala no esporte bretão. Já não tenho mais dúvidas que no nosso país tudo acaba em futebol. Nos ambientes mais improváveis e alheios ao esporte ― seja a Presidência da República, seja uma igreja ou às portas de uma nave espacial, não importa ― sempre tem um brasileiro valendo-se de um jargão, uma metáfora ou qualquer outra referência pertencente ao universo futebolístico. Que outro país produziria um cidadão que, horas antes do momento mais importante de sua vida e de entrar para a história da nação, lembraria de render homenagens a um time de futebol? Depois dessa declaração, Pontes deixou claro que a Pátria de Chuteiras terá, no espaço, um representante digno de sua tradição.
Todavia, temo pelo humor do astronauta brasileiro durante a viagem. Como todo bom torcedor, aposto que ele gostaria de entabular ― entre um buraco negro e outro ― uma conversa sobre futebol com seus colegas. Receio, porém, que seus companheiros de viagem sejam meio avessos a esse gênero de assunto. O americano, será que torce pelo Miami, novo time de Romário? Duvido. E o russo, talvez tenha uma opinião formada sobre a polêmica da comunicação eletrônica entre os árbitros? Improvável. Mas, se usar um pouco da imaginação, Pontes não se sentirá entediado e verá que o espaço guarda semelhanças fortíssimas com o futebol. Basta dar uma olhadinha pela janela. As estrelas, por exemplo. Muito parecidas com aquelas que os times bordam em seus uniformes toda vez que conquistam um título. O Brasil tem cinco, busca a sexta, é quase uma constelação. Falando nisso, se conseguir enxergar a Ursa Maior, Pontes lembrará-se instantaneamente da opulência física de Ronaldo, o Fenômeno. Ou então, passando por Peixes, reconhecerá o mascote do Santos. Isso sem falar nos cometas com toda sua velocidade, potência e direção incerta, como um petardo do Roberto Carlos.
Yuri Gagarin, o primeiro homem a viajar pelo espaço, ao ver nosso planeta lá de cima disse: “A Terra é azul”. Marcos Pontes deve estar pensando que o mundo é, antes de tudo, uma bola.
Vítor Matos é estudante de Comunicação Social na UnB e reveza esta coluna com Guiherme Rocha às quartas-feiras.
6 comentários:
Vc continua afiado até no recesso, hein garotinho?
Marco Prates
"lembrará-se"?
Como assim? Desrespeitando a mesóclise!
Lembrar-se-á!
Muuuuito boa!
iUAHEih! Tenho orgulho de um feto que escreve dessa maneira.
Parabéns, campeão.
boa coluna
parabéns
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